Gravidez e Patenidade – Aspectos Sociais, Culturais e Psicológicos

Entrevista concedida ao Jornal São Caetano Agora (11/08/05)
Alaide D Cantone

As implicações em gerar um filho:

A gravidez é um período de transição que faz parte do processo normal do desenvolvimento onde ocorre uma mudança de identidade e uma nova definição de papéis. Dentro do ciclo vital da mulher, a gravidez seria um período de crise normal de desenvolvimento e não deve ser interpretado como um momento catastrófico no contínuo do desenvolvimento humano, mas “como um momento crucial” onde as soluções encontradas poderão culminar em uma maior maturidade ou então a um grau de desintegração, desorganização e desajustamento da personalidade.

A gravidez é um período que pode ser considerado como uma fase marcada por tensões devido às grandes mudanças que ocorrem no período durante e depois da gravidez. Tais mudanças envolvem aspecto biológico, psicológico e social. A mulher passa por profundas alterações em seu esquema corporal; percebe-se e é percebida de uma forma diferente – uma nova identidade precisa ser definida: a de mãe.

Esta nova identidade envolve também o homem, pois a paternidade implica em se responsabilizar pela criança que vai nascer; ampliar a função de parceria com a sua companheira; terá que se ajustar a essa nova realidade. Com o nascimento do primeiro filho, o casal passa à condição de família e essa terceira pessoa (o bebê), traz muitas transformações na composição da díade conjugal.

Gerar um filho é tarefa nem sempre gratificante para os pais. Muitas vezes, a gravidez não é fruto de uma relação saudável entre um casal, ou seja, não é planejada por ambos ou por um deles e, dessa forma, poderá acrescentar complicações já inerentes nesse período. Evidentemente, cada casal, cada pessoa vivenciará essa fase de maneira bastante particular.

Atualmente, bem diferente de algumas décadas atrás, o homem tem participado mais ativamente do processo gestacional e de parto. A freqüência masculina nas clínicas obstétricas cresceu consideravelmente, pelo acompanhamento de esposas e namoradas grávidas. Conclui-se então, que a gestação é uma etapa não só da vida da mulher, mas sim do casal envolvido.

Para o homem, as tensões e responsabilidades sobre o futuro não exercem tanta influência sobre a sua performance sexual. Dependendo de suas preferências, as alterações estéticas corporais da mulher são mais significativas, e podem servir como barreira ao estímulo de sua libido. O desejo sexual varia muito durante a gravidez. Vale lembrar que isso não é uma regra, e pode ser diferente entre várias mulheres ou numa mesma mulher em gestações diferentes.

Esta “reviravolta” representa uma possibilidade de atingir outros níveis de integração e amadurecimento de ambos. Surge a necessidade de novas adaptações e ajustamentos, tanto no sentido pessoal, quanto no interpessoal.
Quando não há, por parte do casal, a busca de superação de dificuldades, a gravidez poderá representar uma ameaça à relação que possui um frágil equilíbrio: a mulher poderá excluir o parceiro de sua vida, o homem poderá sentir intenso ciúme do filho que vai nascer, ou ainda, quando um ou outro não conseguiu superar uma dependência em relação à própria mãe poderá vir a se relacionar de forma simbiótica com o bebê.

Entretanto, como já ressaltamos, nem todos os casais vivenciam tais tensões, e a intensidade com que são sentidas também é extremamente variável segundo cada ecossistema cultural e familiar.

Em função dos aspectos mencionados bem como pela forte presença da visão judaico-cristã em nossa cultura (onde o sexo tem como função básica a reprodução e o prazer “permitido” na maternidade é o de gerar uma vida), as relações sexuais poderão ser afetadas. Por mais incrível que possa parecer, ainda hoje a maternidade e sexo são duas situações que, para alguns casais, não combinam, podendo inclusive gerar conflitos emocionais tanto no homem, quanto na mulher.

De acordo com algumas crenças e mitos religiosos, algumas inverdades surgiram, como: a penetração pode machucar o bebê; a ejaculação dentro da vagina pode afogar o bebê; ser mãe é algo sagrado, logo, ter sexo durante a gravidez, pode ser considerado como pecado; toda atenção tem que ser dedicada ao bebê, nada mais é importante, etc.

Síndrome de Couvade: o homem gravídico:

No período gestacional da mulher, poderão ocorrer no parceiro uma identificação e rivalidade com a mulher, onde são desencadeados sentimentos de empatia (o homem expressa o desejo de participar mais ativamente da gestação), e de uma certa inveja pela capacidade da mulher gestar um feto dentro de si. Nesta síndrome, há uma variedade de reações no homem, desde a ansiedade simples, até sintomas de uma gravidez, como enjôo, sono, desenvolvimento de barriga. Esta síndrome poderá afetar tanto positiva (aproximação e desejo sexual pela parceira), quanto negativamente a sexualidade do casal (dependendo da forma como o homem lida com todas essas questões).

Dependendo da forma como foi criado, de acordo com a psicanálise, a gravidez poderá desencadear no homem uma certa revivência edípica, gerando fantasias incestuosas em relação à mãe/mulher, o que acaba desencadeando o desinteresse sexual pela companheira, dissociando desta maneira o sexo da vivência da maternidade.

Gravidez e Sexualidade:

De acordo com algumas pesquisas, a atividade sexual, durante a gravidez, sofre uma redução de 40 a 60%, em virtude de alguns fatores: no 1º trimestre poderá surgir o medo de abortar, sentimentos de rejeição à gravidez e/ou ao parceiro(a), desconfortos físicos (náuseas, vômitos, azia, dor de cabeça, etc.), medo do futuro, restrição religiosa, prescrição médica, etc.

Um aumento do desejo e atividade sexual poderá ser retomado durante o 2º trimestre. Já no 3º trimestre, o desejo sexual poderá ficar menos freqüente, devido à: baixa auto-estima da mulher relacionada às suas modificações corporais, diminuição do interesse do parceiro, medos com relação ao parto, restrição médica, etc.

No primeiro trimestre de gestação, a tendência é a de diminuição do desejo sexual da mulher. A emoção da realização do desejo de ser mãe encobre todos os outros desejos, voltando-se assim para o preparo do enxoval, os cuidados como corpo, e outras preocupações características da gestação. As fantasias sobre o aborto aparecem, e alguns desconfortos decorrentes dessa fase, como enjôos, náuseas e sonolência também contribuem para um certo afastamento do sexo. Pode acontecer também, para ambos, o surgimento do conflito da mulher-esposa-amante X mulher-esposa-mãe, causando uma certa confusão de papéis e como conseqüência um certo bloqueio sexual.

Tanto homens quanto mulheres passam por adaptações físicas e emocionais, inclusive na sua relação sexual durante a gestação. Não é raro nos depararmos com mudanças físicas nos parceiros de gestantes, como o aumento de peso e, em algumas situações, intolerância gástrica.

Alterações na Vida Sexual:

No 1º trimestre ocorrem transformações iniciais do corpo e dos genitais da gestante. Nessa fase, ela se volta para o planejamento de uma vida, agora, familiar: não mais apenas de casal. Poderão surgir algumas fantasias de causar o aborto nesta fase, o que pode contribuir para a diminuição do desejo no casal, além de desconfortos comuns como náuseas.

O 2º trimestre é demarcado como uma volta do desejo feminino ao normal, ou até mesmo de maior intensidade. Há relatos que nesta fase, o desejo foi o mais intenso de suas vidas, sentindo-se muito atraentes e felizes. Para o homem, pode haver o primeiro impacto ao perceber, de fato, a gestação de sua esposa, pois nesse período a barriga torna-se mais aparente.

O 3º trimestre é demarcado por maiores desconfortos, principalmente após o 8o mês. Um aumento da freqüência urinária pode ocorrer e a barriga muda o centro de gravidade da mulher, tornando-a um pouco mais desajeitada ao caminhar.
As fantasias voltam: agora, o casal teme ser flagrado e espiado pelo feto durante a relação sexual. Alguns homens temem bater na cabeça do bebê com o pênis durante a penetração. As posições assumidas no ato sexual vão se restringindo mais, havendo preferência pela posição “de ladinho”. Temores de ameaça de aborto bem como complicações de parto prematuro poderão ocorrer.

Os casais ficam mais reticentes em buscar atividade sexual, e alguns até mesmo se abstêm. Por vezes, a ansiedade nas mulheres por não haver gratificação sexual pode ser mais lesiva que o coito, excetuando-se situações onde haja contra-indicação de atividade sexual pelos riscos de parto prematuro ou descolamento de placenta, por exemplo.

No último mês, alguns obstetras recomendam abstinência até o final da gravidez, outros apenas na última semana. Concordam na abstinência se existir algum risco obstétrico. Alguns recomendam sexo até o final mesmo, evitando-se ansiedades sexuais por parte da mulher. Cada caso precisa ser ponderado nas suas particularidades.

Após o parto, recomenda-se um período de abstinência até se recomeçar a vida sexual (aproximadamente de 4 a 6 semanas). No entanto, muitos casais mantêm atividade sexual bem antes disto. A mulher vai apresentar menos desejo sexual devido a alterações hormonais, com aumento da Prolactina e também pela exaustão do pós-parto e dos cuidados iniciais com um bebê.

Alguns homens sentem-se distanciados emocionalmente e sexualmente de suas esposas nessa fase. Outros sentem que não têm com quem compartir seus medos ou que serão menos homens se demonstrarem suas debilidades.

Por outro lado, há homens que enfrentam a gravidez da parceira sem grandes problemas. Ser pai pode ser uma boa oportunidade para mudar a forma de pensar, permitir-se, sentir, demonstrar insegurança e afeto.

Qual é a melhor maneira de acompanhar a gravidez da companheira?

Gerar um filho, dividir preocupações, alegrias e dúvidas, é um papel do casal.
Na gravidez, os parceiros têm a tarefa de adaptar-se a estas mudanças e ao novo membro da família a fim de encontrar um equilíbrio, o que leva um determinado tempo. Estes são momentos de grande importância: a experiência de serem pais, o crescimento do casal, a confiança no futuro e o comprometimento de criar este ser juntos.

Algumas dicas, sugeridas por Stephanie Sapin-Lignieres e Prof. Marcus Renato de Carvalho, poderão auxiliar na participação efetiva e afetiva dos pais na gravidez:

1) Participe da escolha da equipe de saúde.
Afinal, eles é que vão cuidar de sua mulher e de seu filho neste momento tão importante. Não fuja dizendo: “confio na escolha dela”. Eles vão, inclusive, determinar se você vai participar do parto e como.

2) Acompanhe sua mulher em todas as consultas e exames.
Não perca a oportunidade de ouvir o coração de seu filho ou de vê-lo na ultra-sonografia mesmo que sua sogra insista e que sua mulher ache que “não precisa”.

3) Matricule-se num curso de preparação para casais grávidos.
Você vai encontrar outros homens com as mesmas preocupações e vai poder esclarecer um monte de dúvidas além de se preparar para participar ativamente do parto.

4) Desenvolva sua vida sexual.
É comum que ocorra uma diminuição do seu apetite sexual ou dela. Não se afaste, procure a orientação da Monitora Perinatal ou do Médico e conserve com ela a respeito. Mesmo que não haja relação sexual, pode haver momentos de extrema sensualidade muito satisfatórios e enriquecedores, propiciando novas descobertas.

5) Tenha muita paciência.
Com o aumento da sensibilidade dela, você terá que enfrentar seus acessos de choro sem causa e sua grande necessidade de proteção, além de dar-lhe milhares de demonstrações de carinho e declarações de amor.

6) Faça contato com seu filho.
Mesmo que trabalhe muito e chegue em casa cansado, encontre um tempo para entrar em contato com o bebê, dentro da barriga, sem medo de ser ridículo. Ele ouve e reconhece sua voz a partir do 5o. mês de gravidez. Você pode desenvolver uma comunicação intensa e extremamente gratificante com ele.

7) Informe-se.
Procure ler livros e revistas que ela lê para poderem comentar juntos. Não tenha vergonha de chegar no escritório com revista de bebê, seus colegas talvez riam, mas, no fundo, sentirão admiração e, até inveja.

8) Dê palpites no enxoval.
Não se limite a pagar, participe da escolha do berço, do carrinho, do enxoval. Faça destas compras passeios agradáveis por terras até então desconhecidas por você, intercalando um lanche ou uma refeição e, até, um cinema.

9) Cuide de sua alimentação.
Mostre-se interessado na sua alimentação mas sem imposição, cobrança ou qualquer tipo de radicalismo. Deixe que coma o que tem vontade, ajudando-a, somente a conter os excessos.

10) Faça a mala.
Prepare sua bagagem com um mês de antecedência e coloque nela tudo que precisar para poder permanecer, com ela, na maternidade, o tempo que ela ficar.

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Dicas para a participação efetiva e afetiva do pai no parto

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1) Mantenha-se calmo.

Durante o curso de preparação, você se familiarizou com todas as possibilidades e percebeu que não há necessidade de correr. Portanto, você pode relaxar: A hora finalmente chegou e está tudo sob controle.

2) Controle as contrações.
O médico gostará de saber a freqüência das contrações para determinar a hora da internação.

3) Leve-a, sozinho, para a maternidade.
Você se sentirá mais a vontade e ela também. Avise a família somente quando o bebê estiver quase nascendo, evitando os palpites sem impedir que participe da alegria do nascimento.

4) Esteja atento.
Coloque uma música relaxante, faça uma massagem suave nos intervalos das contrações, ajude-a encontrar a melhor posição, leve-a para passear no corredor, faça a respiração com ela.

5) Entre na sala de parto.
Coloque a roupa esterilizada, lave as mãos até o cotovelo, tire o relógio e permaneça ao seu lado até o nascimento.

6) Corte o cordão umbilical.
Você vai adorar inaugurar esta nova vida, possibilitar a autonomia de seu filho, desligando-o fisicamente de sua mulher.

7) Fique junto de seu filho.
Sua mulher ficará mais tranquila se você ficar com o bebê do que com ela. Acompanhe o pediatra para saber o peso, o comprimento, as notas do Apgar e o resultado dos testes, levando-o logo para junto de sua mãe.

8) Dê o primeiro banho.
Você ficará surpreso de ver como é simples e agradável. Seu bebê vai adorar, relaxar, até… sorrir!!!

9) Limite as visitas.
Visita é bom, mas tem limite. Não deixe que fique muita gente no quarto, nem muito tarde. A tranquilidade da mãe e do bebê é mais importante que o receio de magoar as visitas.

10) Passe a noite na maternidade.
Esta primeira noite é muito importante. Não deixe sua sogra ocupar seu lugar. Você é o pai e é muito capaz de cuidar de sua mulher e de seu filho com a assessoria da enfermagem