Pai Ausente – Filho Doente

Entrevista concedida à Revista Saúde – Editora Abril
Data: outubro/2007

Pesquisas provam que a figura paterna é tão importante para a criança que, quando ela se sente sistematicamente relegada a segundo plano, acaba com problemas de saúde.

MENTE SÃ, CORPO SÃO
Médicos e psicólogos dedicados ao estudo da psicossomática — área que tenta desvendar a interação entre a saúde psíquica e os problemas físicos – acreditam que os resultados da pesquisa australiana são uma prova contundente de que a figura paterna é importantíssima no desenvolvimento infantil. “A imagem do pai é aquela de quem costuma impor limites aos filhos. Então, faz sentido a idéia de que sua ausência esteja relacionada a transtornos alimentares, por exemplo”, opina a psicóloga Maria Rosa Spinelli, da Associação Brasileira de Medicina Psicossomática (ABMP). “Décadas atrás, a participação do casal no dia-a-dia das crianças, e não só a do pai, era muito maior”, ressalva a psicóloga Solange Lopes de Souza, também da ABMP. Hoje em dia o tempo livre é dedicado mais para atividades de lazer em benefício próprio. “E o tempo é um fator que conta muito na qualidade da convivência”, assegura Solange.

Além de problemas como a obesidade, o afastamento do pai — definitivo ou não — pode ter outras conseqüências no desenvolvimento infantil. Existem evidências recentes de um elo entre a ausência da figura paterna e a aceleração do amadurecimento sexual nas meninas. O psicólogo Bruce Ellis, da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, mostra que a consolidação das relações familiares ajuda a retardar a menarca, ou primeira menstruação. Em sua pesquisa, ele observou 173 garotas desde a idade pré-escolar até a 7a série. Segundo ele, aquelas que conviviam satisfatoriamente com os pais durante os cinco primeiros anos de vida entraram na puberdade mais tarde.

Outro psicólogo americano, Robert Matchock, da Universidade do Estado da Pensilvânia, acompanhou cerca de 2 mil meninas em idade escolar e chegou a conclusões semelhantes, mas acrescentou outro dado interessante às descobertas na área: os ferormônios – substâncias que em vários animais têm a ver com o amadurecimento e o impulso sexual – podem estar associados com a data em que as meninas entram na puberdade. E aqui contam não apenas a influência do papai, mas também da mamãe, dos irmãos e de qualquer outro membro da família. “Uma das hipóteses da nossa pesquisa é a de que substâncias químicas emitidas por pessoas que fazem parte desse núcleo podem ter algum vínculo com o amadurecimento infantil”, explica Matchock. Os dados dessa investigação são relevantes, mas estão longe de resolver as questões envolvidas no processo de desenvolvimento de uma criança.

Carinho, atenção, ferormônios… Tudo isso pode ter conseqüências na formação do indivíduo. E, diante das novas configurações familiares, em que tempo de sobra é artigo de luxo, é preciso estar cada vez mais atento para as necessidades da criançada. Por isso, papai, quando o moleque quiser brincar e você estiver lendo o jornal, pense duas vezes antes de deixar o filhote na mão. Um dia sem atender aos apelos infantis não vai transformar seu pequeno em um jovem problemático, nem doente, nem em um obeso. Mas os momentos que vocês desfrutarem juntos – acredite – vão fazer um bem enorme a ele.

MAMÃES PRECOCES
A psicóloga Alaide Degani de Cantone, coordenadora do Centro de Pesquisas e Estudos em Psicologia e Saúde, em São Paulo, observou meninas que tinham engravidado com 15 ou 16 anos e chegou a uma conclusão preocupante: as adolescentes podem usar a gravidez como forma de compensar uma família sem a estrutura adequada, que não forneceu a elas a atenção necessária durante a infância. “Em geral essas meninas se referem aos pais como figuras ausentes e fracas”, diz a psicóloga. “Com a gestação a garota buscaria, inconscientemente, uma resolução para o seu desamparo como filha”, completa.

CARINHO PARA QUEM PRECISA
O que é um pai ausente? Não, não é aquele que se separou e, por isso, não vê os filhos todos os dias. “Trata-se da figura paterna que pouco ou nada contribui para a formação e a educação dos filhos, independentemente do fato de morar ou não na mesma casa”, esclarece a psicóloga Alaide Degani de Cantone. E como participar do desenvolvimento da molecada? A especialista dá algumas dicas: “Participe dos momentos importantes, felizes ou não, procure compreender a criança nos seus momentos mais adversos, orientando-a e propondo alternativas para a vida”. Nem sempre é fácil, mas vale muito a pena.