Psicossomática – A Linguagem do Corpo no Adoecer

Iniciando um entendimento da trajetória da saúde para o adoecimento e vice-versa, nos fundamentaremos em alguns conceitos importantes e bem atuais, apontados por Maurício Knobel.

O autor considera a saúde como sendo o resultado dinâmico e estrutural do aparelho psíquico funcionando adequadamente, ou seja, possuindo algumas características, tais como:

– a ausência de sinais de sofrimento do organismo não é igual à saúde
– a saúde não é somente ausência de enfermidade
– ser saudável não é um estado que o indivíduo obterá ou perderá de uma vez por todas

Quanto à saúde mental Knobel a concebe como a capacidade que tem o ser humano de viver:
– dentro dos limites impostos por seu físico
– com outros seres humanos
– sentindo-se feliz
– produtivamente
– sem ser um estorvo

Enfatiza que uma personalidade bem integrada está implicada a uma adaptação crítica que pressupõe um ponto de vista histórico, religioso, social e antropológico.

Dessa forma, considera-se uma pessoa saudável aquela que segue um objetivo próprio, um propósito de vida assim como ideais os quais deseja realizar traçando caminhos para essa concretização.

E quando os conflitos psíquicos são tão perturbadores que chegam a bloquear a capacidade de intuir a alegria do viver?

Sabemos que desde o nascimento, cotidianamente, nos deparamos com diversas situações sejam de alegrias e/ou de conflitos, sendo estes últimos, capazes de gerar angústias neurótica, psicótica ou existencial.

De acordo com Otto Rank, Freud diz que o trauma do nascimento seria o protótipo da angústia; para outros, Melaine Klein por exemplo, diante da incapacidade de projetar a pulsão de morte, o ser é ameaçado com o aniquilamento ou desintegração estrutural, ocasionando o cáos psíquico – psicose, que é mais temida e angustiante que a própria morte.

Dessa forma, entram em funcionamento todos os mecanismos de defesa do indivíduo dentro da sua singularidade.

“Ninguém é o que quer, senão, na realidade, o que pode (ser)” (Knobel, 1977)

A avaliação desses eventos perturbadores e as reações resultantes serão únicas; dependerão de uma série de fatores como as experiências vividas, o momento existencial do sujeito e seu próprio desenvolvimento do aparelho psíquico, questões essas que são de uma singularidade muito pessoal e individual, onde devem ser respeitadas as interações do sujeito com o mundo externo e também com seu mundo interno, dados os diferentes ângulos de percepção que o sujeito possa vir a ter tornando determinado evento estressante ou não.

O ser humano é de vasta complexidade; seus aspectos físicos e mentais estão inseridos em um estado de interação simbiótica, já anteriormente descrita por Aristóteles: “psique (alma) e corpo reagem um com outro, uma mudança no estado da psique produz uma mudança no corpo e vice-versa”.

Sendo assim podemos dizer que todas as doenças têm seus aspectos psicológicos que devem ser levados em consideração em todo o processo de adoecer.

A patologia passa então a ser interpretada como algo que não está “funcionando bem” tanto em suas características físicas como mentais. Adoecer também poderá ser compreendido como uma expressão de um estado psíquico atípico; como se o sujeito expressasse através do soma (corpo), seus males psíquicos.

É plausível de observação que o adoecer está intimamente ligado com a capacidade do sujeito lidar com suas emoções e sentimentos.

A manifestação dos sintomas é um sinal de que algo não vem fluindo bem há algum tempo; esses sintomas representariam a quebra dos limites do sujeito. Assim, quando o nível de suportação de adversidades é extrapolado, as alterações emocionais tornam-se presentes, antes e durante o curso da patologia, podendo estas alterações emocionais ser dos mais diversos cunhos, seja um sentimento de insegurança, retraimento social, dificuldade para expressar seus sentimentos, sensibilidade afetiva muito aumentada, incapacidade de lidar com perdas e frustrações.

Dessa forma, poderíamos dizer que a manifestação somática, ou seja, o adoecer, está interligado à tentativa de manter o prazer, resgatar algo que se perdeu, que tem medo de perder ou na manutenção de algo ou alguém que se quer.

PERESTRELLO (1982), ressalta que antigos conceitos negavam as implicações psicológico-emocionais, bem como a subjetividade da vida emocional, implícita nos relacionamentos interpessoais e, dentro de uma visão organicista, o relacionamento médico-paciente se restringia ao questionamento da queixa da doença, sua evolução, sua história, sem que se buscasse a reação emocional.

No entanto, enfatiza que a pessoa é única, com impressões digitais que a distinguem de qualquer outra; possui uma fisionomia diferente dos outros, assim como suas próprias formas de viver, de conviver, de agir, de reagir, tendo uma configuração única e um modo de adoecer, também próprios.

Reflexão:

“O adoecimento do ser humano é uma das formas de expressão
quando ele se encontra no limiar do sofrimento.
Cabe ao profissional da área da Saúde, buscar compreender
essa forma de linguagem.
Foi a única maneira que o paciente encontrou para dizer
que ele não está, absolutamente, conseguindo lidar,
com um certo equilíbrio,
com as situações difíceis da sua vida” (Cantone A.D.)